segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Por um pacto matrimonial

Um aluno, assustado com o alto índice de divórcio atual, pediu minha opinião sobre a importância do casamento hoje, quis saber se a tradição de ir ao altar, diante de testemunhas, para pronunciar os votos de respeito, amor e fidelidade mútuos ainda tem alguma relevância real para o casal. Antes que eu começasse a responder, ele pediu mais um tempo e citou o projeto de lei do Estado norte-americano do México, onde a Assembleia Legislativa discute uma mudança no código civil que consiste em substituir a tradicional aliança matrimonial por contratos de casamento que possam ser renovados ou não, de dois em dois anos, segundo a decisão dos cônjuges. O objetivo é evitar os altos custos, tanto de ordem financeira como emocional, dos divórcios que acontecem aos borbotões naquele Estado. Apesar de reconhecer as próprias limitações para responder a uma questão tão inteligente sobre assunto de natureza tão complexa, senti-me na obrigação de emitir minha opinião. Pensei que podia recorrer a bons livros, escritos por especialistas do assunto.

"Apesar da atual banalização do casamento e do consequente flagelo do divórcio, com todos os deletérios resultados, entendo que o nosso esforço deve ser por um pacto matrimonial que dure a vida inteira, mas que dure prazerosamente, apesar das dificuldades que, sem dúvida, surgirão." Foram as palavras que imediatamente saíram de minha boca, resposta inspirada nas ideias de Dennis Rainey, a cuja obra* recorro agora para desenvolver uma resposta mais completa para meu aluno.

Vamos desmembrar a frase acima em fatores para que nos apropriemos da profundidade dela. Sendo assim, falemos primeiramente de PACTO MATRIMONIAL QUE DURE A VIDA INTEIRA. Segundo Rainey, o significado da palavra pacto (cortar) na Bíblia representa uma decisão séria entre duas partes que selam mutuamente uma promessa por meio de um ato de dilaceramento de animais que envolve sangue, e a Bíblia refere-se frequentemente a pactos como meio que Deus escolheu para firmar promessas inabaláveis com o seu povo.

É muito esclarecedor ver que o primeiro pacto registrado na Bíblia refere-se ao primeiro casamento da história humana, quando Deus casou Adão e Eva, atribuindo valor essencial ao ato de um homem e uma mulher manterem fidelidade um ao outro por toda vida, o que é tema recorrente em toda a Bíblia Sagrada.

Por que a aliança do casamento foi investida de tanta importância? Porque, dentre outras razões, Deus estava criando ali no Éden o modelo primeiro e último, mais adequado, do que seria o relacionamento entre ele e seu povo, dentro de um modelo pactual, de corpo e alma, isso primeiramente entre Deus e Israel, no Antigo Testamento, e depois entre Cristo e sua igreja no Novo Testamento. Isso é muito sério. O relacionamento de Deus como o seu povo é um envolvimento de almas e é ilustrado pelo casamento. Será que os cristãos pensam nisso quando vão ao altar? Enquanto namoramos, estamos apaixonados demais, ou pressionados demais, para pensar nisso. No dia do casamento, estamos exaustos e ansiosos demais para pensarmos nas palavras pactuais pronunciadas pelo pastor. A preparação da festa, a roupa da nova, o salão, os convidados etc. A cerimônia ocorre rápido, muitas delas nem enfatizam a questão do pacto, e os votos parecem mais um mero acordo.

Renovação da aliança

A aliança matrimonial é a figura perfeita usada pela Bíblia para ilustrar a aliança entre Deus e seu povo, e convém lembrar que, da mesma forma que Deus costumava renovar frequentemente o pacto firmado com Israel (Gn 12, 15,16), numa prevenção contra a memória curta e o desgaste do tempo, o pacto matrimonial precisa ser periodicamente renovado. Ademais, monumentos memoráveis eram erguidos por ordem de Deus a fim de refrescar a memória dos seus escolhidos em relação ao pacto, ideia que pode ser muito edificante se aplicada ao casamento.

A prática de renovação de aliança matrimonial está em ascensão atualmente. Várias celebridades têm reafirmado a lealdade ao parceiro em festas pomposas com direito a todos os rituais próprios do casamento. Sou da opinião de que, desde que se tenham recursos para tal, o ato é muito importante para reestruturar a relação a partir da memória das juras feitas um dia no altar. Aos que não dispõem de tanto recursos, poder-se-iam aproveitar datas especiais como o aniversário do casamento para renovar a aliança e relembrar compromissos.

Sou a favor de que haja memoriais em cada canto estratégico de nosso espaço para nos lembrar de nosso pacto matrimonial. Num lugar bem destacado da casa ou do escritório, um quadro com fotografia dos noivos no momento solene do matrimônio, bem como das testemunhas, como a olharem em nossa direção exigindo de nós o cumprimento das promessas firmadas no altar. No lugar onde eu passo maior parte do tempo em minha casa tem uma fotografia minha ao lado de minha esposa com a frase que colocamos no nosso convite de casamento há onze anos. Toda vez que olho para aquele quadro na parede, lembro-me de que jurei fidelidade eterna a uma mulher, e isso descarta qualquer possibilidade de rompimento em minhas motivações. Nós não conduzimos nossa relação matrimonial dentro de uma possibilidade de rompimento. Portanto, nos momentos de tensão, nosso esforço deve ir sempre no sentido de resolver e superar, por mais difícil que pareça ser.

Muitos dos desgastes que acontecem nos casamentos acontecem porque os cônjuges trabalham, consciente ou inconscientemente, com a ideia de que se não der certo... a fila anda, como se um pacto pudesse se desfazer facilmente. Todo casamento cujos membros têm a consciência permeada pela possibilidade de separação tem grandes chances de não dar certo, porque cada um dos cônjuges, nas horas de tensão, vai enxergar o fim do relacionamento como uma possível saída, boicotando as medidas corretas para pôr fim à crise. Ficam sempre em cima do muro e nunca tomam a real decisão de serem felizes a qualquer custo.

Nosso esforço para que dure prazerosamente.

Consiste num plano que faça o amor entre ambos perdurar até que a morte os separe.

Toda terapia de casal deve começar com a decisão firme de ambos os cônjuges de que terão um casamento saudável. Decidir, de antemão, que terá um casamento saudável e feliz é o passo mais importante para ser feliz no casamento. Porque casamento feliz não é fruto do ocaso. Casamento é uma instituição que, como qualquer relação na vida, precisa de investimento.

Você pode escolher amar seu esposo (a) ou rejeitá-lo (a), porque amar não é um sentimento, é uma escolha. Não me venha com este papo de dizer “eu não a amo mais”. Você pode até não estar sentindo atração sexual por seu cônjuge, e pode ser que ele esteja contribuindo muito para isso, mas se você decidir prontamente amá-lo (a), você amará.

O padre João Mohana** se vale do desabafo de uma mulher que comentou com ele: “Pensei que aquele amor nunca acabaria”, para falar sobre a inconstância do coração humano. E então ele exalta a importância de uma sólida consciência para dirigir o barco nos momentos de oscilação do amor. Para o padre, o amor humano tem dois componentes, 1) sensorial, proveniente da sensibilidade, que é sensação; 2) espiritual, que brota da liberdade da vontade de querer amar, do querer do homem e da mulher que livremente se amam – é decisão, é opção. "Só o homem ama porque quer amar e quando quer amar, e quando decide amar. E quando não quer, tranca o amor, volta as costas ao amor, foge, bane, recua", afirma Mohana.

Para que o casamento dure prazerosamente, a agente precisa priorizar o casamento. 

Se você estabelecer uma lista de prioridades em sua vida, digamos o  que você quer para daqui a dez anos, qual lugar da lista seu casamento ocupa? 


•A gente só é determinado a gastar recursos e energia naquilo que se sobressaia em importância sobre todas as demais coisas. E existem setores da vida que, devido à importância gigantesca que tem para que atinjamos o sucesso, não podem ser relegados a segundo plano. Acredito que o casamento deva encabeçar essa lista.

 •Vejo pessoas se queixando continuadamente das crises que enfrentam no relacionamento conjugal em busca de orientação e ajudas mágicas para resolverem os conflitos, porém sem disposição para mudarem de postura para salvar o que nunca deveria ter sido posto em risco.

•A vida é um vasto campo de possibilidades, mas o angustiante é que todas as vezes que investimos recursos em uma escolha, automaticamente desinvestimos nas outras. Ou todas as vezes que fazemos uma escolha, abrimos mão definitivamente das outras possibilidades concorrentes. Lembro de um amigo que desejava ser o melhor funcionário da empresa onde trabalhava até que percebeu que não era possível conciliar ser o melhor funcionário com ter uma família saudável. Resultado: contentou-se com uma posição média na empresa e priorizou a família.

•Sendo assim, para a construção de um relacionamento conjugal saudável, acima de qualquer coisa, precisamos priorizar o casamento, decidir que vai amar o cônjuge e ter um casamento feliz. Agora, para atingir aquilo que priorizamos, será necessário muito esforço, investimento, energia e paciência, principalmente porque a maneira individualista e competitiva como a sociedade hodierna se comporta só contribui para o solapamento da instituição familiar.



*Rainey, Dennis. Ministério com famílias no século 21: oito grandes ideias para pastores e líderes. São Paulo: Vida, 2003.

** Mohana, João. Não basta amar para ser feliz no casamento. São Paulo: Edições loyola, 1994, p 87.

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